39. Contrário seria às leis da natureza e, portanto, milagroso,
o fato de voltar à vida corpórea um indivíduo que se
achasse realmente morto. Ora, não há mister se recorra a
essa ordem de fatos, para ter-se a explicação das ressurreições que Jesus operou.
Se, mesmo na atualidade, as aparências enganam por
vezes os profissionais, quão mais frequentes não haviam
de ser os acidentes daquela natureza, num país onde nenhuma
precaução se tomava contra eles e onde o sepultamento
era imediato*. É, pois, de todo ponto provável que, nos dois casos acima, apenas síncope ou letargia houvesse.
O próprio Jesus declara positivamente, com relação à
filha de Jairo: Esta menina, disse ele, não está morta, está
apenas adormecida.
Dado o poder fluídico que ele possuía, nada de espantoso
há em que esse fluido vivificante, acionado por uma
vontade forte, haja reanimado os sentidos em torpor; que
haja mesmo feito voltar ao corpo o Espírito, prestes a
abandoná-lo, uma vez que o laço perispirítico ainda se não
rompera definitivamente. Para os homens daquela época,
que consideravam morto o indivíduo desde que deixara de
respirar, havia ressurreição em casos tais; mas, o que na
realidade havia era cura e não ressurreição, na acepção
legítima do termo.
* Uma prova desse costume se nos depara nos Atos dos Apóstolos,
5:5 e seguintes.
“Ananias, tendo ouvido aquelas palavras, caiu e rendeu o Espírito
e todos os que ouviram falar disso foram presas de grande temor.
— Logo, alguns rapazes lhe vieram buscar o corpo e, tendo-o
levado, o enterraram. — Passadas umas três horas, sua mulher
(Safira), que nada sabia do que se dera, entrou. — E Pedro lhe
disse. . . etc. — No mesmo instante, ela lhe caiu aos pés e rendeu o
Espírito. Aqueles rapazes, voltando, a encontraram morta e, levando-a,
enterraram-na junto do marido.”