As estrelas fixas
37.
As estrelas chamadas “fixas” e que constelam
os dois hemisférios do firmamento não se acham de todo isentas de qualquer
atração exterior, como geralmente se supõe. Longe disso: elas pertencem todas a
uma mesma aglomeração de astros estelares, aglomeração que não é senão a grande
nebulosa de que fazemos parte e cujo plano equatorial, projetado no céu,
recebeu o nome de Via-Láctea. Todos os sóis que a constituem são solidários;
suas múltiplas influências reagem perpetuamente umas sobre as outras e a
gravitação universal as grupa todas numa mesma família.
38.
Esses diversos sóis estão na sua maioria,
como o nos-so, cercados de mundos secundários, que eles iluminam e fecundam por
intermédio das mesmas leis que presidem à vida do nosso sistema planetário.
Uns, como Sírio, são milhares de milhões de vezes mais grandiosos e
magnificentes em dimensões e em riquezas do que o nosso e muito mais importante
é o papel que desempenham no Universo. Também planetas em muito maior número e
muito superiores aos nossos os cercam. Outros são muito dessemelhantes pelas
suas funções astrais. É assim que certo número desses sóis, verdadeiros gêmeos
da ordem sideral, são acompanhados de seus irmãos da mesma idade, e formam, no
espaço, sistemas binários, aos quais a Natureza outorgou funções inteiramente diversas das que tocaram ao nosso Sol
[1].
Lá, os anos não se medem pelos mesmos períodos, nem os dias pelos mesmos sóis e
esses mundos, iluminados por um duplo facho, foram dotados de condições de
existência inimagináveis por parte dos que ainda não saíram deste pequenino
mundo terrestre.
Outros astros, sem cortejo, privados de
planetas, receberam elementos de habitabilidade melhores do que os conferidos a
qualquer dos demais. Na sua imensidade, as leis da Natureza se diversificam e,
se a unidade é a grande expressão do Universo, a variedade infinita é
igualmente seu eterno atributo.
39.
Malgrado ao prodigioso número dessas
estrelas e de seus sistemas, malgrado as distâncias incomensuráveis que as
separam, elas pertencem todas à mesma nebulosa estelar que os mais possantes
telescópios mal conseguem atravessar e que as concepções da mais ousada imaginação apenas
logram alcançar, nebulosa que, entretanto, é simplesmente uma unidade na ordem
das nebulosas que compõem o mundo astral.
40.
As estrelas chamadas fixas não estão imóveis
na amplidão. As constelações que se figuraram na abóbada do firmamento não são
reais criações simbólicas. A distância a que se acham da Terra e a
perspectiva sob a qual se mede, da estação terrena, o Universo, constituem as
duas causas dessa dupla ilusão de óptica. (Capítulo V, nº 12.)
41.
Vimos que a totalidade dos astros que
cintilam nacúpula azulada se acha encerrada numa aglomeração cósmica, numa
mesma nebulosa a que chamais Via-Láctea. Mas, por pertencerem todos ao mesmo
grupo, não se segue que esses astros não estejam animados todos de movimento de
translação no espaço, cada um com o seu. Em parte nenhuma existe o repouso
absoluto. Eles têm a regê-los as leis universais da gravitação e rolam no
espaço ilimitado sob a impulsão incessante dessa força imensa. Rolam, não
segundo roteiros traçados pelo acaso, mas segundo órbitas fechadas, cujo centro
um astro superior ocupa. Para tornar, por meio de um exemplo, mais
compreensíveis as minhas palavras, falarei de modo especial do vosso Sol.
42.
Sabe-se, em conseqüência de modernas
observações, que ele não é fixo, nem central, como se acreditava nos primeiros
tempos da nova astronomia; que avança pelo espaço, arrastando consigo o seu
vasto sistema de planetas, de satélites e de cometas.
Ora, não é fortuita esta marcha e ele
não vai, errando pelos vácuos infinitos, transviar seus filhos e seus súditos,
longe das regiões que lhe estão assinadas. Não, sua órbita é determinada e, em
concorrência com outros sóis da mesma ordem e rodeados todos de certo número de
terras habitadas, ele gravita em torno de um sol central. Seu movimento de
gravitação, como o dos sóis seus irmãos, é inapreciável a observações anuais,
porque somente grande número de períodos seculares seriam suficientes para marcar
um desses anos astrais.
43.
O sol central, de que acabamos de falar,
também é um globo secundário relativamente a outro ainda mais importante, a
cujo derredor ele perpetua uma marcha lenta e compassada, na companhia de
outros sóis da mesma ordem.
Poderíamos comprovar esta subordinação
sucessiva de sóis a sóis, até sentirmos cansada a imaginação de subir através
de tal hierarquia, porquanto, não o esqueçamos, em números redondos, uma
trintena de milhões de sóis se pode contar na Via-Láctea, subordinados uns aos
outros, como rodas gigantescas de uma engrenagem imensa.
44.
E esses astros, em números incontáveis,
vivem vida solidária. Assim como, na economia do vosso mundinho terrestre, nada
se acha isolado, também nada o está no Universo incomensurável.
De longe, ao olhar investigador do
filósofo que pudesse abarcar o quadro que o espaço e o tempo desdobram, esses
sistemas de sistemas pareceriam uma poeira de grãos de ouro levantada em turbilhão pelo sopro divino, que
faz voem nos céus os mundos siderais, como voam os grãos de areia no dorso do
deserto.
Em parte nenhuma há imobilidade, nem
silêncio, nem noite! O grande espetáculo que então se nos desdobraria ante os
olhos seria a criação real, imensa e cheia da vida etérea, que no seu
formidável conjunto o olhar infinito do Criador abrange.
Mas, até aqui, temos falado de
uma única nebulosa, que com os milhões de sóis, e os seus milhões de terras
habitadas, forma apenas, como já o dissemos, uma ilha no arquipélago infinito.
É o a que se dá, em
Astronomia, o nome de “estrelas duplas”. São dois sóis, um dos quais gira em
torno do outro, como um planeta em torno do seu sol. De que singular e
magnífico espetáculo não gozarão os habitantes dos mundos que formam esses
sistemas iluminados por duplo sol! Mas, também, quão diferentes não hão de ser
neles as condições da vitalidade!
Numa comunicação dada ulteriormente, acrescentou o Espírito Galileu: “Há
mesmo sistemas ainda mais complicados, em que diferentes sóis desempenham, uns
com relação a outros, o papel de satélites. Produzem-se então maravilhosos
efeitos de luz, para os habitantes dos globos que tais sóis iluminam, tanto
mais quanto, sem embargo da aparente proximidade em que se encontram uns dos
outros, podem mundos habitados circular entre eles e receber alternativamente
as ondas de luz diversamente coloridas, cuja reunião recompõe a luz branca.”