Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1864

Allan Kardec

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Em vários jornais franceses e estrangeiros lê-se o artigo seguinte:

“Os espíritas acabam de recrutar novos adeptos na Alemanha. Um certo médico de Zittau, chamado Berthelen, autor de um opúsculo sobre as mesas girantes, organizou uma sociedade que se intitula: Associação dos caçadores de tesouros, e que tem por objetivo cavar o solo das localidades onde se pressupõe haver tesouros enterrados. As operações da empresa são conduzidas por uma sonâmbula das mais lúcidas, a Sra. Louise Ebermann, e começaram por escavações cotidianas executadas em hora determinada, em meio a uma plantação de fumo, onde se acharia oculta a soma de 400.000 thalers (1.500.000 francos). A sociedade tem apenas sete ou oito membros que participam dos trabalhos, e até agora suas operações se limitam a dizer preces em comum e a remover, com certo cerimonial, a terra retirada do solo onde esperam descobrir os bem-vindos tesouros.”

É realmente curioso ver o entusiasmo de certos jornais em reproduzir tudo o que, em sua opinião, possa lançar o descrédito sobre o Espiritismo. O menor acontecimento, infeliz ou ridículo, ao qual, com ou sem razão, se acha associada a palavra espírita, é imediatamente repetido por toda parte, com variantes mais ou menos engenhosas, sem preocupação com a verdade. Os disparates, mesmo os mais inverossímeis, são aceitos com uma seriedade verdadeiramente cômica. Com a aparição dos espectros nos teatros, todos repetem satisfeitos que o Espiritismo naufragou, e que os seus mais importantes cordões foram enfim descobertos. Um charlatão, um saltimbanco, um ledor da buena-dicha julga dever apropriar-se do nome de espírita, e logo os adversários o assinalam como um dos representantes da doutrina. Que resultou de tudo isto? Repercussão do nome, e daí o desejo de conhecer a coisa; o ridículo para os trocistas, que falam esturdiamente do que não sabem; o ódio caído sobre os caluniadores e, em consequência, aumento do número dos adeptos sérios, os únicos que são contados entre os espíritas.

O artigo acima pertence à categoria de que acabamos de falar. A si próprio o autor se dá um desmentido, dizendo que as pesquisas são feitas com o auxílio de uma sonâmbula das mais lúcidas. Não é, pois, com o auxílio dos Espíritos. Em que se baseia ele para dizer que é uma associação de espíritas? Do fato do fundador ter escrito um opúsculo sobre as mesas girantes. Disso se conclui que ele é espírita? De modo algum, porque à época das mesas girantes ainda se estava no abc da ciência. Aliás, se ele conhecesse o Espiritismo, saberia que os Espíritos não podem favorecer nenhuma pesquisa de tal natureza.

Desde que o sonambulismo passou a ser conhecido, ele tem sido empregado na busca de tesouros, e até agora ninguém conseguiu senão gastar dinheiro em escavações inúteis, como sucedeu outrora com aqueles que procuravam a pedra filosofal. Predizemos a mesma sorte à nova empresa!

Quando se soube que os Espíritos podiam comunicar-se, um primeiro pensamento, aliás muito natural, também foi que eles pudessem servir utilmente às especulações de toda a natureza, mas não tardou a se reconhecer que, nesse ponto, só se obtinham mistificações. Para isto havia uma causa, e foram os próprios Espíritos que a indicaram. Assim, não há hoje um só espírita esclarecido que perca tempo em perseguir tais quimeras, pois todos sabem que Deus não dá aos homens semelhantes meios de enriquecer, e que por esta razão não permite aos Espíritos revelações desse gênero.

É, pois, abusivamente que o autor do artigo colocou a associação alemã dos caçadores de ouro sob o patrocínio do Espiritismo. Não é entre os que não veem nos Espíritos senão servos da ambição, da cupidez e dos interesses materiais que a doutrina recruta os seus adeptos, mas entre os que a consideram como uma causa do melhoramento moral.

Para mais ampla instrução a respeito, remetemos ao Livro dos médiuns, Cap. XXVI, Perguntas que podem ser dirigidas aos Espíritos; nº. 291, Perguntas sobre os interesses morais e materiais; nº. 294, Perguntas sobre as invenções e descobertas e nº. 295, Perguntas sobre tesouros ocultos.

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