4.
Eis como a Igreja explica a intervenção exclusiva dos demônios nas
manifestações modernas.*
“Em sua intervenção exterior, os demônios não
estão menos atentos a dissimular sua presença, para afastar as
suspeitas. Sempre ardilosos e pérfidos, atraem o homem para as suas
emboscadas antes de lhe imporem as correntes da opressão e da servidão.
Aqui, despertam a curiosidade por fenômenos e jogos pueris; ali,
impressionam pelo espanto e subjugam pela atração do maravilhoso. Se o
sobrenatural aparece, se seu poder os desmascara, eles acalmam e
apaziguam as apreensões, solicitam a confiança, provocam a
familiaridade. Ora se fazem passar por divindades e bons gênios; ora
tomam emprestados os nomes e mesmo os traços dos mortos que deixaram uma
memória entre os vivos. Graças a essas fraudes dignas da antiga
serpente, eles falam, e são escutados; eles dogmatizam, e crê-se neles;
misturam a suas mentiras algumas verdades, e fazem aceitar o erro sob
todas as formas. É aí que desembocam as pretensas revelações de
além-túmulo; é para obter esse resultado que a madeira, a pedra, as
florestas e as fontes, o santuário dos ídolos, o pé das mesas, a mão das
crianças, proferem oráculos; é por isso que a pitonisa profetiza em seu
delírio, e que o ignorante, num misterioso sono, se torna subitamente o
doutor da ciência. Enganar e perverter, tal é, em toda parte e em todos
os tempos, o objetivo final dessas estranhas manifestações.
“Os
resultados surpreendentes dessas observâncias ou desses atos, na maioria
bizarros e ridículos, não podendo proceder de sua virtude intrínseca,
nem da ordem estabelecida por Deus, não se pode esperá-los a não ser do
concurso das potências ocultas. Tais são, notadamente, os fenômenos
extraordinários obtidos, em nossos dias, pelos procedimentos, em
aparência inofensivos do magnetismo, e o órgão inteligente das mesas
falantes. Por meio dessas operações da magia moderna, vemos
reproduzirem-se entre nós as evocações e os oráculos, as consultas, as
curas e os prestígios que ilustraram os templos dos ídolos e os antros
das sibilas. Como antigamente, comanda-se a madeira e a madeira obedece;
interroga-se, e ela responde em todas as línguas e sobre todas as
questões; fica-se na presença de seres invisíveis que usurpam os nomes
dos mortos, e cujas pretensas revelações são marcadas pelo cunho da
contradição e da mentira; formas ligeiras e sem consistência aparecem de
repente, e se mostram dotadas de força sobre-humana.
“Quais são os
agentes secretos desses fenômenos, e os verdadeiros atores dessas cenas
inexplicáveis? Os anjos não aceitariam esses papéis indignos, e não se
prestariam a todos os caprichos de uma vã curiosidade. As almas dos
mortos, que Deus proíbe consultar, permanecem na morada que sua justiça
lhes designou, e elas não podem, sem sua permissão, pôr-se às ordens dos
vivos. Os seres misteriosos que acorrem assim ao primeiro apelo do
herético e do ímpio como do fiel, do crime como da inocência, não são
nem os enviados de Deus, nem os apóstolos da verdade e da salvação, mas
os sequazes do erro e do inferno. Apesar do cuidado que tomam de se
esconder sob os nomes mais veneráveis, traem-se pelo vazio de suas
doutrinas, não menos do que pela baixeza de seus atos e a incoerência de
suas palavras. Esforçam-se por apagar do símbolo religioso os dogmas do
pecado original, da ressurreição dos corpos, da eternidade das penas, e
toda a revelação divina, a fim de retirar às leis sua verdadeira
sanção, e abrir ao vício todas as barreiras. Se suas sugestões pudessem
prevalecer, elas formariam uma religião cômoda, para uso do socialismo e
de todos aqueles que a noção do dever e da consciência importuna. A
incredulidade de nosso século preparou-lhes o caminho. Possam as
sociedades cristãs, por um retorno sincero à fé católica, escapar ao
perigo desta nova e temível invasão!”
* As citações deste capítulo são tiradas da mesma pastoral que as do capítulo precedente, do
qual são a sequência, e têm a mesma autoridade.