1. Em
todos os tempos o homem acreditou, por intuição, que a vida futura
devia ser bem-aventurada ou desventurada em razão do bem e do mal que se
realiza aqui embaixo; porém a ideia que ele faz dessa vida futura está
em relação com o desenvolvimento de seu senso moral, e as noções mais ou
menos exatas que possui do bem e do mal; penas e recompensas são
reflexo de seus instintos predominantes. É assim que os povos guerreiros
colocam sua suprema felicidade nas honrarias prestadas à bravura, os
povos caçadores na abundância da caça, os povos sensuais nas delícias da
volúpia. Enquanto o homem for dominado pela matéria, pode só
imperfeitamente compreender a espiritualidade, é por isso que faz das
penas e dos gozos futuros um quadro mais material que espiritual;
imagina que se deve beber e comer no outro mundo, mas melhor do que na
terra, e coisas melhores.* Chegado a certo nível, há nas crenças
referentes ao futuro uma mistura de espiritualidade e de materialidade; é
assim que ao lado da beatitude contemplativa, ele coloca um inferno com
torturas físicas.
* Um garoto saboiano, ao qual o padre pintava um quadro sedutor da vida futura, perguntou-lhe
se lá todo o mundo comia pão branco como em Paris.