Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1863

Allan Kardec

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De São Petersburgo escrevem-nos a 1º de julho último:

“...No Livro dos Espíritos, livro I, Capítulo I, nº. 2, notei esta proposição: Tudo quanto é desconhecido é infinito. Parece-me que muitas coisas nos são desconhecidas, sem que por isto sejam infinitas. Como o vocábulo se acha em todas as edições, pedi a explicação ao meu guia, que me respondeu: “O vocábulo infinito aqui é um erro. Deve ser indefinido. Que pensar disto?...”


Resposta:

Os dois vocábulos, posto que sinônimos no sentido geral, têm, cada um, uma acepção especial. A Academia assim os define:

Indefinido, cujo fim e cujos limites não são ou não podem ser determinados. Tempo indefinido. Número indefinido. Linha indefinida. Espaço indefinido.


Infinito, que não tem começo nem fim, que é sem marcos e sem limites. O espaço é infinito. Deus é infinito. A misericórdia de Deus é infinita. Por extensão, diz-se daquilo de que se não podem assinalar os marcos, o termo, e, por exagero, tanto no sentido físico quanto no moral, de tudo quanto é muito considerável em seu gênero. Diz-se particularmente para inumerável. Uma duração infinita. A beatitude infinita dos eleitos. Astros situados a uma distância infinita. Eu vos faço um agradecimento infinito. Uma infinita variedade de objetos. Penas infinitas. Há um número infinito de autores que escreveram sobre este assunto.

Resulta daí que o vocábulo indefinido tem um sentido mais particular e o vocábulo infinito, um sentido mais geral; que o primeiro se diz de preferência a propósito de coisas materiais e o segundo de coisas abstratas, portanto, ele é mais vago que o outro.

O sentido mais geral da palavra infinito permite aplicá-la, em certos casos, ao que não é senão indefinido, ao passo que o inverso não poderia ter lugar. Diz-se igualmente: uma duração infinita e uma duração indefinida, mas não se poderia dizer: Deus é indefinido, sua misericórdia é indefinida.

Sob este ponto de vista o emprego do vocábulo infinito na frase precitada não é abusivo e não é um erro. Dizemos mais, que o vocábulo indefinido não exprimiria a mesma ideia. Do momento que uma coisa é desconhecida, ela tem para o pensamento o vago do infinito, senão absoluto, ao menos relativo.

Por exemplo: Não sabeis o que vos acontecerá amanhã, portanto vosso pensamento erra no infinito; os acontecimentos é que são indefinidos. Não sabeis quantas estrelas há, portanto, seu número é indefinido, mas é também infinito para a imaginação. No caso de que se trata, convinha, pois, empregar o vocábulo que generaliza o pensamento, de preferência ao que lhe daria um sentido restritivo.

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