O que é o Espiritismo?

Allan Kardec

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O maravilhoso e o sobrenatural

V. — O Espiritismo tende, evidentemente, a fazer reviver as crenças fundadas no maravilhoso e no sobrenatural; ora, no século positivo em que vivemos, isto me parece difícil, porque é exigir que se acredite nas superstições e nos erros populares, já condenados pela razão.

A. K. — Uma ideia só é supersticiosa quando falsa; mas cessa de o ser desde que passe a ser uma verdade reconhecida.

A questão está em saber se os Espíritos se manifestam, ou não; ora, isso não pode ser tachado de superstição, antes de ficar provado que não existem Espíritos.

Direis: a minha razão não aceita essas comunicações; porém, os que creem e que não são nenhuns mentecaptos invocam também as suas razões e, além disso, os fatos; para que lado se deve pender? O grande juiz, nesta questão, é o futuro — como tem sido em todas as questões científicas e industriais classificadas como absurdas e impossíveis em sua origem.

Pretendeis julgar a priori segundo a vossa opinião; nós só o fazemos depois de, por muito tempo, ter visto e observado. Acresce que o Espiritismo esclarecido, como o é hoje, procura, ao contrário, destruir as ideias supersticiosas, mostrando o que há de real ou de falso nas crenças populares, denunciando o que nelas existe de absurdo, fruto da ignorância e dos preconceitos.

Vou mais longe e digo que é precisamente o positivismo do nosso século que faz com que adotemos o Espiritismo, e que este deve, em parte, àquele a rapidez da sua propagação, antes que, como alguns pretendem, a uma recrudescência do amor ao maravilhoso e ao sobrenatural.

O sobrenatural desaparece à luz do facho da ciência, da filosofia e da razão, como os deuses do paganismo ante o brilho do Cristianismo. Sobrenatural é tudo o que está fora das leis da natureza. O positivismo nada admite que escape à ação dessas leis; mas, porventura, ele as conhece a todas?

Em todos os tempos foram reputados sobrenaturais os fenômenos cuja causa não era conhecida; pois bem: o Espiritismo vem revelar uma nova lei, segundo a qual a conversação com o Espírito de um morto é um fato tão natural, como o que se dá por intermédio da eletricidade entre dois indivíduos separados por uma distância de cem léguas; o mesmo acontece com os outros fenômenos espíritas.

O Espiritismo repudia, nos limites do que lhe pertence, todo efeito maravilhoso, isto é, fora das leis da natureza; ele não faz milagres nem prodígios, antes explica, em virtude de uma dessas leis, certos efeitos, demonstrando, assim, a sua possibilidade. Ele amplia, igualmente, o domínio da ciência, e é nisto que ele próprio se torna uma ciência; como, porém, a descoberta dessa nova lei traz consequências morais, o código das consequências faz dele, ao mesmo tempo, uma doutrina filosófica.

Deste último ponto de vista, ele corresponde às aspirações do homem, no que se refere ao seu futuro; e como a sua teoria do futuro repousa sobre bases positivas e racionais, ela agrada ao espírito positivo do nosso século.

É o que compreendereis, quando vos derdes ao trabalho de estudá-lo. (O Livro dos Médiuns, cap. II, e Revue spirite, dezembro de 1861, pág. 393, e janeiro de 1862, pág. 21. Ver também o cap. II abaixo.)

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