O capitão Nivrac (Morto a 11 de fevereiro de 1862; evocado a pedido de seu amigo Cap. Blou, membro da sociedade. Médium: Sr. Leymarie)
O Sr. Nivrac era um homem nutrido por sérios estudos e uma notável inteligência. Inutilmente o capitão Blou lhe havia falado do Espiritismo e ofertado todas as obras que tratam do assunto. Ele olhava todas essas coisas como utopias e os que as seguem como sonhadores.
A lº. de fevereiro ele passeava com um de seus camaradas, atacando esse assunto, como de costume, quando, passando em frente a uma vitrine de livraria, viram a brochura O Espiritismo na sua expressão mais simples.
Boa inspiração diz o Sr. Blou.
Comprou-a, o que certamente não teria feito se eu estivesse presente.
Desse dia em diante o capitão Nivrac leu O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns e alguns números da Revista Espírita.
Seu espírito e seu coração foram tocados. Longe de atacar, ele vinha fazer-me perguntas, e entre os oficiais tornou-se um zeloso propagandista do Espiritismo, a tal ponto que durante oito dias a doutrina nova foi o assunto de todas as conversas.
Ele desejava muito assistir a uma sessão, quando a morte veio surpreendê-lo sem nenhuma causa aparente de doença. A 11 de fevereiro, terça-feira, estando no banho, às quatro horas, expirava nos braços do médico. “Não estará aí o dedo de Deus”, pergunta o capitão Blou, “permitindo que o meu amigo abrisse os olhos à luz antes de sua morte?”
l. Evocação.
─ Compreendo por que desejais falar-me. Sinto-me feliz com
esta evocação e feliz venho a vós, porque é um amigo que me pede e nada podia
ser-me mais agradável.
OBSERVAÇÃO: O Espírito adianta-se à pergunta que ia ser
feita, que era a seguinte: “Posto não tenhamos a vantagem de vos haver
conhecido, pedimos que viésseis em nome do vosso amigo, capitão Blou, nosso
colega, e ficaremos encantados por conversar convosco, se assim quiserdes”.
2. ─
Sois feliz... (O Espírito não deixa concluir a pergunta, que assim terminaria:
...por ter conhecido o Espiritismo antes de morrer?)
─ Sou feliz porque acreditei antes de morrer. Lembro-me das
discussões que tive contigo, meu amigo, porque eu repelia
todas as doutrinas novas. Na verdade eu estava abalado. Eu dizia à minha
mulher, à minha família, que era maluquice escutar semelhantes bobagens e que
te julgava perturbado. Eu assim pensava, mas
felizmente pude crer e esperar. Minha posição é mais feliz porque Deus me
promete um avanço muito desejado.
3. ─
Como pôde uma pequena brochura de algumas páginas ter mais autoridade sobre vós
que as palavras de vosso amigo, no qual devíeis ter confiança?
─ Eu estava abalado, porque a ideia de uma vida melhor está
no fundo de todas as religiões. Eu acreditava
instintivamente, mas as ideias do soldado tinham modificado meus pensamentos.
Eis tudo. Quando li a brochura, fiquei emocionado. Achei que aqueles conceitos revelavam uma doutrina tão clara e
precisa, que Deus me apareceu na sua bondade. O Futuro pareceu-me menos
sombrio. Acreditei, porque devia crer, e a brochura tocava meu coração.
4. ─
De que morrestes?
─ Morri de um derrame cerebral. Deram várias razões: era uma
efusão do cérebro. O tempo estava marcado e eu devia partir.
5. ─
Poderíeis descrever as sensações no momento da morte e depois do vosso despertamento?
─ A passagem da vida à morte é uma sensação dolorosa, mas
rápida. A gente pressente tudo quanto pode acontecer. Toda a vida se apresenta
espontaneamente, como numa miragem, e a gente tem vontade de retomar todo o
passado, a fim de purificar os maus dias, e esse pensamento nos acompanha na
transição espontânea da vida à morte, que não é mais do
que outra vida. Fica-se atordoado pela luz nova e eu fiquei numa
confusão de ideias muito singular. Eu não era um
Espírito perfeito. Não obstante, pude cair em mim
e dou graças a Deus por me haver esclarecido antes de morrer.
OBSERVAÇÃO: Este quadro da passagem da vida à morte tem
uma chocante analogia com o dado pelo Sr. Sanson. Notemos, entretanto, que não
se trata do mesmo médium.
6. ─
Vossa situação atual seria diversa se não tivésseis conhecido e aceitado as
ideias espíritas?
─ Sem dúvida, mas eu tinha uma natureza boa e franca e,
embora não seja muito adiantado, não é menos certo que Deus recompensa as boas
decisões, inclusive a última.
7. ─
É inútil perguntar-vos se... (O Espírito não deixa concluir a pergunta, que
seria: ...ides ver vossa esposa e vossa filha, mas não vos podeis fazer ouvir.
Quereis que lhes transmitamos algum recado?)
─ Sem dúvida, estou sempre perto dela. Encorajo-a a ter
paciência e lhe digo: Coragem, amiga! Enxugue as lágrimas e sorria a Deus, que
lhe dará forças. Pense que minha existência é um avanço, uma purificação, e que
necessito da ajuda de suas preces. Com todas as forças desejo uma encarnação
nova e, posto a separação terrena seja cruel, lembre-se de que a amo, que você
está só e necessita de boa saúde e de muita resignação para se manter. Mas eu
estarei ao seu lado para a encorajar, abençoar e amar.
8. ─
Temos certeza de que vossos camaradas do regimento ficariam felizes se
recebessem algumas palavras vossas. A esta pergunta junto outra, que talvez
caiba na vossa alocução. Até agora o Espiritismo quase não se propagou no
exército, a não ser entre os
oficiais. Pensais que seria útil o fosse
também entre os soldados? Qual seria o resultado?
─ É necessário que a cabeça se torne séria para que o corpo
a siga. Compreendo que os oficiais tenham primeiro aceitado essas soluções
filosóficas e sensatas, dadas pelo Livro
dos Espíritos. Por essas leituras o oficial compreende melhor o seu dever;
torna-se mais sério e menos sujeito a zombar da tranquilidade das famílias;
habitua-se à ordem no seu interior e comer e beber deixam de ser os principais
móveis de sua vida. Por eles, os suboficiais aprenderão e propagarão. Eles
conseguirão, se quiserem. Eu lhes digo: Avante!
Sempre avante! Este é um novo campo de batalha da Humanidade,
apenas sem feridas, sem metralha, mas em tudo a harmonia, o amor e o dever. E o
soldado será um homem liberal, no bom sentido. Ele terá a coragem e a boa
vontade que fazem do operário um bom cidadão, um homem de Deus.
Segui, portanto, o novo rumo! Sede apóstolos, conforme Deus,
e dirigi-vos ao infatigável propagador da Doutrina, o autor do livrinho que me
esclareceu.O soldado que se torna espírita é mais fácil de comandar,
mais submisso, mais disciplinado, porque a submissão lhe será um dever
sancionado pela razão, ao passo que, na maioria dos casos, não passa de
resultado do constrangimento.
Eles não mais se embrutecerão nos excessos que muito
frequentemente engendram as sedições e os levam a ignorar
a autoridade. Dá-se o mesmo com todos os subordinados, seja de que classe
forem: operários, empregados e outros. Eles desempenharão mais
conscienciosamente as suas tarefas quando se derem conta da causa que os
colocou em tal posição na Terra e da recompensa que espera os humildes na outra
vida.
Infelizmente muito poucos creem na outra vida, o que os leva
a dar tudo à vida presente. Se a incredulidade é uma chaga social, o é
sobretudo nas camadas inferiores da Sociedade, onde não há o contrapeso da
educação e o respeito à opinião.
Quando os que são chamados ao exercício da autoridade, seja
a que título for, compreenderem o que lucrarão por terem subordinados imbuídos
de ideias espíritas, farão todos os esforços possíveis para direcioná-los por esse caminho.
Mas, paciência! Isso virá.
LESPINASSE