15. Não é tudo. “Deus permite que eles ocupem ainda um lugar nessa
criação, nas relações que eles deviam ter com o homem e da qual fazem o
mais pernicioso abuso.” Deus podia ignorar o abuso que eles fariam da
liberdade que lhes concede? Então por que ele a concede? Logo, é com
conhecimento de causa que ele entrega suas criaturas à mercê deles,
sabendo, em virtude de sua onisciência, que elas sucumbirão e terão o
destino dos demônios. Não era suficiente a própria fraqueza delas, sem
permitir que fossem estimuladas ao mal por um inimigo tanto mais
perigoso quanto invisível? Ainda, se o castigo fosse apenas temporário e
o culpado pudesse redimir-se pela reparação! Mas não: está condenado
para toda a eternidade. Seu arrependimento, seu retorno ao bem, seus
lamentos são supérfluos.
Os demônios são assim os agentes provocadores
predestinados a recrutar almas para o inferno, e isso com a permissão de
Deus, que sabia, criando essas almas, o destino que lhes estava
reservado. O que se diria, na terra, de um juiz que fizesse isso para
povoar as prisões? Estranha ideia que nos dão da Divindade, de um Deus
cujos atributos essenciais são a soberana justiça e a soberana bondade! E
é em nome de Jesus Cristo, daquele que não pregou senão o amor, a
caridade e o perdão, que se ensinam semelhantes doutrinas! Houve um
tempo em que tais anomalias passavam desapercebidas; não se
compreendiam, não se sentiam; o homem, curvado sob o jugo do despotismo,
submetia cegamente sua razão, ou melhor, abdicava de sua razão; mas
hoje a hora da emancipação soou: ele compreende a justiça, ele a quer
durante sua vida e após a morte; é por isso que ele diz: “Isso não
existe, isso não é possível, ou Deus não é Deus!”