Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1868

Allan Kardec

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Precedidos de sua prece e da maneira de curar os que sofrem[1]

As citações são a melhor maneira de dar a conhecer o espírito de um livro. Para começar, tomamos no prefácio, a conselho e do editor, as passagens seguintes do que acaba de publicar o Sr. Jacob. Os fatos, aos quais ele deve a sua notoriedade, são muito conhecidos para que seja preciso relembrá-los. Aliás, nós os expusemos suficientemente na Revista de outubro e novembro de 1866, nas proximidades do campo de Châlons, e nos números de outubro e novembro de 1867.

“Henri Jacob, hoje músico no regimento dos zuavos da guarda imperial, nasceu a 6 de março de 1828, em Saint-Martin-des-Champs - Saône-et-Loire. Todos os seus estudos consistem em um ano na escola comunal; assim, não recebeu outra educação senão a que o pai lhe pôde dar; ela não ultrapassa a da simples leitura e escrita, contudo, foi ele que redigiu este escrito que entregamos à publicidade, sem auxílio de ninguém

“Jacob não é um escritor de profissão; é um homem de aspirações religiosas, que não se decidiu a entregar este volume à publicidade senão ante solicitações muito insistentes. Para ele, esta obra é a sua profissão de fé no Deus criador; uma prece, um hino, por assim dizer, que ele dirige ao Todo-Poderoso. É escrito com um bom espírito, sem paixão, e ele aí não faz alusão a nenhum culto e a nenhum espírito de partido político.

“Jacob é um ser dotado de alguma imaginação, nada mais. O leitor se enganaria muito se visse nos seus sentimentos outra coisa senão Deus e a Humanidade. Toda a sua ambição é trazer algum alívio a esta última.

“Nestas páginas, vemos uma espécie de heroísmo e de grandeza refletindo-se nos atos de filantropia tão maravilhosamente realizados por Jacob, crente firme, que sabe que pode muito porque Deus vem em seu auxílio em seus trabalhos tão difíceis, e que só Deus o leva a bom termo.”

Para começar, o Sr. Jacob revela, em termos simples e sem ênfase, um sonho ou visão que contribuiu para a elevação de seus pensamentos para Deus, e para fixar suas ideias sobre o futuro.

Vem, a seguir, uma profissão de fé, em forma de epístola, intitulada: Aos meus irmãos em Espiritismo, da qual extraímos as passagens seguintes:

“Antes de minha iniciação à ciência espírita, eu vivia nas trevas; meu coração jamais havia sentido as doçuras da paz! Minha alma jamais tinha conhecido a alegria; eu vivia apegado à Terra, com os tormentos que ela suscita aos homens vinculados à matéria, sem imaginar que há mundos melhores, que Deus, nosso pai de todos, criou para permitir gozar de uma felicidade inefável os que praticam o bem aqui embaixo.

“Por minha iniciação à Doutrina Espírita, adquiri a convicção de que Deus, em sua misericórdia, nos envia bons Espíritos para nos aconselhar e nos encorajar na prática do bem, e nos deu o poder de nos comunicarmos com eles e com os que deixaram esta Terra e que são caros aos nossos corações. Esta convicção esclareceu a minha alma! Eu vi a luz. Pouco a pouco fortaleci-me em minha convicção e, por este meio, atingi a faculdade de médium escrevente.

“Minhas conversas com os Espíritos e seus bons conselhos encheram-me de uma fé viva, confirmando-me as verdades da ciência espírita, que fortaleciam a minha fé, e pela fé, a faculdade de curar me foi dada.

“Assim, pois, meus caros amigos, que uma fé viva esteja sempre em nós, pela prática das máximas espíritas, que são: o amor a Deus, a fraternidade e a caridade. Amemo-nos uns aos outros, e todos possuiremos a faculdade de nos aliviarmos mutuamente, e muitos poderão chegar a curar, disto tenho a convicção.

“Sejamos, pois, sempre caridosos e generosos e seremos sempre assistidos pelos bons Espíritos. Vós todos, que sois iniciados na Doutrina Espírita, ensinai-a aos que ainda estão nas trevas da matéria; abri suas almas à luz e eles gozarão, por antecipação, da felicidade que nos mundos superiores aguarda aqueles que praticam o bem entre nós.

“Sede firmes em vossas boas resoluções; vivei sempre numa grande pureza de alma, e Deus vos dará o poder de curar vossos semelhantes. Eis a minha prece:

“‘Meu Deus, fazei-me a graça de permitir que os bons e benevolentes Espíritos me venham assistir, de intenção e de fato, na obra de caridade que desejo realizar, aliviando os infelizes que sofrem. É em vosso nome e em vosso louvor, meu Deus, que esses benefícios se espalham sobre nós.’

“Crede, tende fé! E quando quiserdes aliviar um doente, depois de vossa prece, ponde vossa mão sobre o seu coração, e pedi calorosamente a Deus a ajuda de que necessitais e, tenho a convicção, o eflúvio divino infiltrar-se-á em vós para aliviar ou curar vosso irmão que sofre. Minha primeira cura consciente foi fazer sair de seu leito de dor um colérico, operando dessa maneira. Por que queríeis que eu fosse mais privilegiado do que vós, por Deus, que é sabedoria e justiça?

“Por vossas cartas, pedis-me que eu me corresponda convosco e ajude com meus conselhos. Vou comunicar-vos o que os Espíritos me inspiraram, e responder ao vosso apelo, cheio de boa vontade de ser útil à vossa felicidade. A minha seria grande se eu pudesse cooperar para a vitória do grau de perfeição em que desejo vervos chegar.”

Segue-se uma série de 217 cartas que constituem, a bem dizer, o corpo do volume. São comunicações obtidas pelo Sr. Jacob, como médium escrevente, em diferentes grupos ou reuniões espíritas. São excelentes conselhos de moral, em estilo mais ou menos correto; encorajamentos à prática da caridade, da fraternidade, da humildade, da doçura, da benevolência, do devotamento pela Doutrina Espírita, do desinteresse moral e material; exortações à reforma de si mesmo. O mais severo moralista aí não encontrará nada a contestar, e seria desejável que todos os médiuns, curadores e outros, e todos os espíritas em geral, pusessem em prática esses sábios conselhos. Não podemos senão felicitar o Sr. Jacob pelos sentimentos que ele exprime; e lendo esse livro, não virá à mente de ninguém que seja obra de um charlatão; é, pois, um desmentido dado às acusações que à malevolência interesseira aprouve lançar contra ele, bem como àqueles que, por irrisão, o apresentaram como um taumaturgo ou fazedor de milagres.

Embora essas numerosas comunicações sejam todas concebidas num excelente espírito, é de lamentar que a uniformidade dos assuntos que tratam lance um pouco de monotonia sobre essa leitura. Elas não encerram explicações nem instruções especiais sobre a mediunidade curadora, que é apenas a parte acessória do Livro. O relato de alguns fatos autênticos de curas e das circunstâncias que as acompanharam teria contribuído para o interesse e utilidade prática desta obra.

Aliás, eis como o Sr. Jacob descreve o que se passa nas sessões em que se reúnem os doentes:

“No momento da sessão, depois de haver dirigido a Deus minha curta mas fervorosa prece, sinto os meus dedos se contraírem e, tocando o doente, reconheço a força do fluido pela umidade das suas mãos; às vezes elas são inundadas de transpiração, e o calor que ganham as partes inferiores é também um complemento de indício do alívio quase instantâneo que ele experimenta.

“Entretanto, não é por minha própria inspiração que os doentes devem ver desaparecerem os males que os acabrunham, mas antes pela vontade de Deus; vejo também errar em volta de mim, em meio a uma brilhante luz, um grande número de Espíritos benevolentes que parecem associar-se à minha penosa missão. Há sobretudo um que me deixa perceber muito distintamente a auréola que circunda sua cabeça venerável. A seus lados se acham duas pessoas muito radiosas, cercadas de inúmeros Espíritos. O primeiro parece guiar-me e me inspirar em minhas operações, se assim me posso exprimir; enfim, a sala onde dou as consultas está sempre cheia de uma viva luz que vejo continuamente refletir-se sobre os doentes.

“Depois da sessão, não me resta a menor lembrança do que se passou; é por isto que recomendo muito insistentemente às pessoas presentes que prestem a maior atenção às palavras que dirijo aos doentes que a mim se oferecem para serem examinados e curados, se isto for possível.”

A obra termina por alguns conselhos sobre o regime higiênico que devem seguir os doentes de que ele cuida.



[1] Um vol. in-12, de 220 páginas. Preço 2,50 francos. No editor, Rua Bonaparte, 70.


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