25. Esta narrativa, tão simples e singela, traz em si evidente
o cunho da veracidade. Nada aí há de fantasista, nem de
maravilhoso. É uma cena da vida real apanhada em flagrante.
A linguagem do cego é exatamente a desses homens
simples, nos quais o bom-senso supre a falta de saber
e que retrucam com bonomia aos argumentos de seus
adversários, expendendo razões a que não faltam justeza,
nem oportunidade. O tom dos fariseus, por outro lado, é o
dos orgulhosos que nada admitem acima de suas inteligências
e que se enchem de indignação à só ideia de que um
homem do povo lhes possa fazer observações. Afora a cor
local dos nomes, dir-se-ia ser do nosso tempo o fato.
Ser expulso da sinagoga equivalia a ser posto fora da
Igreja. Era uma espécie de excomunhão. Os espíritas, cuja
doutrina é a do Cristo de acordo com o progresso das luzes
atuais, são tratados como os judeus que reconheciam em
Jesus o Messias. Excomungando-os, a Igreja os põe fora de
seu seio, como fizeram os escribas e os fariseus com os
seguidores do Cristo. Assim, aí está um homem que é expulso
porque não pode admitir seja um possesso do demônio aquele que o curara e porque rende graças a Deus pela
sua cura!
Não é o que fazem com os espíritas? Obter dos Espíritos
salutares conselhos, a reconciliação com Deus e com o
bem, curas, tudo isso é obra do diabo e sobre os que isso
conseguem lança-se anátema. Não se têm visto padres declararem,
do alto do púlpito, que é melhor uma pessoa conservar-se
incrédula do que recobrar a fé por meio do Espiritismo?
Não há os que dizem a doentes que estes não deviam
ter procurado curar-se com os espíritas que possuem esse
dom, porque esse dom é satânico? Não há os que pregam
que os necessitados não devem aceitar o pão que os espíritas
distribuem, por ser do diabo esse pão? Que outra coisa
diziam ou faziam os padres judeus e os fariseus? Aliás,
fomos avisados de que tudo hoje tem que se passar como
ao tempo do Cristo.
A pergunta dos discípulos — Foi algum pecado deste
homem que deu causa a que ele nascesse cego?
— revela que
eles tinham a intuição de uma existência anterior, pois, do
contrário, ela careceria de sentido, visto que um pecado somente pode ser causa de uma enfermidade de nascença,
se cometido antes do nascimento, portanto, numa existência
anterior. Se Jesus considerasse falsa semelhante ideia,
ter-lhes-ia dito: “Como houvera este homem podido pecar
antes de ter nascido?” Em vez disso, porém, diz que aquele
homem estava cego, não por ter pecado, mas para que nele
se patenteasse o poder de Deus, isto é, para que servisse de
instrumento a uma manifestação do poder de Deus. Se não
era uma expiação do passado, era uma provação apropriada
ao progresso daquele Espírito, porquanto Deus, que é
justo, não lhe imporia um sofrimento sem utilidade.
Quanto ao meio empregado para a sua cura, evidentemente
aquela espécie de lama feita de saliva e terra nenhuma
virtude podia encerrar, a não ser pela ação do fluido
curativo de que fora impregnada. É assim que as mais insignificantes
substâncias, como a água, por exemplo, podem
adquirir qualidades poderosas e efetivas, sob a ação
do fluido espiritual ou magnético, ao qual elas servem de
veículo, ou, se quiserem, de reservatório.