33.
O princípio da reencarnação é uma consequência necessária da lei de
progresso. Sem a reencarnação, como se explicaria a diferença que existe
entre o presente estado social e o dos tempos de barbárie? Se as almas
são criadas ao mesmo tempo que os corpos, as que nascem hoje são tão
novas, tão primitivas, quanto as que viviam há mil anos; acrescentemos
que nenhuma conexão haveria entre elas, nenhuma relação necessária;
seriam de todo estranhas umas às outras. Por que, então, as de hoje
haviam de ser melhor dotadas por Deus, do que as que as precederam?
Por
que têm aquelas melhor compreensão? Por que possuem instintos mais
apurados, costumes mais brandos? Por que têm a intuição de certas
coisas, sem as haverem aprendido? Duvidamos de que alguém saia desses
dilemas, a menos admita que Deus cria almas de diversas qualidades, de
acordo com os tempos e lugares, proposição inconciliável com a ideia de uma justiça soberana. (Cap. II, nº 10.)
Admiti,
ao contrário, que as almas de agora já viveram em tempos distantes; que
possivelmente foram bárbaras como os séculos em que estiveram no mundo,
mas que progrediram; que para cada nova existência trazem o que
adquiriram nas existências precedentes; que, por conseguinte, as dos
tempos civilizados não são almas criadas mais perfeitas, porém que se
aperfeiçoaram por si mesmas com o tempo, e tereis a única explicação
plausível da causa do progresso social. (O Livro dos Espíritos, Parte
2ª, caps. IV e V.)
34. Pensam
alguns que as diferentes existências da alma se efetuam, passando elas
de mundo em mundo e não num mesmo orbe, onde cada Espírito viria uma
única vez. Seria admissível esta doutrina, se todos os habitantes da
Terra estivessem no mesmo nível intelectual e moral.
Eles então
só poderiam progredir indo de um mundo a outro e nenhuma utilidade lhes
adviria da encarnação na Terra. Desde que aí se notam a inteligência e a
moralidade em todos os graus, desde a selvajaria que beira o animal até
a mais adiantada civilização, é evidente que esse mundo constitui um
vasto campo de progresso. Por que haveria o selvagem de ir procurar
alhures o grau de progresso logo acima do em que ele está, quando esse
grau se lhe acha ao lado e assim sucessivamente? Por que não teria
podido o homem adiantado fazer os seus primeiros estágios senão em
mundos inferiores, quando ao seu derredor estão seres análogos aos
desses mundos? quando, não só de povo a povo, mas no seio do mesmo povo e
da mesma família, há diferentes graus de adiantamento? Se fosse assim,
Deus houvera feito coisa inútil, colocando lado a lado a ignorância e o
saber, a barbaria e a civilização, o bem e o mal, quando precisamente
esse contato é que faz que os retardatários avancem.
Não há,
pois, necessidade de que os homens mudem de mundo a cada etapa de
aperfeiçoamento, como não há de que o estudante mude de colégio para
passar de uma classe a outra. Longe de ser isso vantagem para o
progresso, ser-lhe-ia um entrave, porquanto o Espírito ficaria privado
do exemplo que lhe oferece a observação do que ocorre nos graus mais
elevados e da possibilidade de reparar seus erros no mesmo meio e em
presença dos a quem ofendeu, possibilidade que é, para ele, o mais
poderoso modo de realizar o seu progresso moral. Após curta coabitação,
dispersando-se os Espíritos e tornando-se estranhos uns aos outros,
romper-se-iam os laços de família, à falta de tempo para se
consolidarem.
Ao inconveniente moral se juntaria um inconveniente
material. A natureza dos elementos, as leis orgânicas, as condições de
existência variam, de acordo com os mundos; sob esse aspecto, não há
dois perfeitamente idênticos. Os tratados de Física, de Química, de
Anatomia, de Medicina, de Botânica, etc., para nada serviriam nos outros
mundos; entretanto, não fica perdido o que neles se aprende; não só
isso desenvolve a inteligência, como também as idéias que se colhem de
tais obras auxiliam a aquisição de outras. (Cap. VI, nos 61 e
seguintes.) Se apenas uma única vez fizesse o Espírito a sua aparição,
freqüentemente brevíssima, num mesmo mundo, em cada imigração ele se
acharia em condições inteiramente diversas; operaria de cada vez sobre
elementos novos, com força e segundo leis que desconheceria, antes de
ter tido tempo de elaborar os elementos conhecidos, de os estudar, de os
aplicar. Teria de fazer, de cada vez, um novo aprendizado e essas
mudanças contínuas representariam um obstáculo ao progresso. O Espírito,
portanto, tem que permanecer no mesmo mundo, até que haja adquirido a
soma de conhecimentos e o grau de perfeição que esse mundo comporta. (Nº
31.)
Que os Espíritos deixem, por um mundo mais adiantado,
aquele do qual nada mais podem auferir, é como deve ser e é. Tal o
princípio. Se alguns há que antecipadamente deixam o mundo em que vinham
encarnando, é isso devido a causas individuais que Deus pesa em sua
sabedoria. Tudo na criação tem uma finalidade, sem o que Deus não seria
nem prudente, nem sábio. Ora, se a Terra se destinasse a ser uma única
etapa do progresso para cada indivíduo, que utilidade haveria, para os
Espíritos das crianças que morrem em tenra idade, vir passar aí alguns
anos, alguns meses, algumas horas, durante os quais nada podem haurir
dele? O mesmo ocorre se pondere com referência aos idiotas e aos
cretinos. Uma teoria somente é boa sob a condição de resolver todas as
questões a que diz respeito.
A questão das mortes prematuras há
sido uma pedra de tropeço para todas as doutrinas, exceto para a
Doutrina Espírita, que a resolveu de maneira racional e completa. Para o
progresso daqueles que cumprem na Terra uma missão normal, há vantagem
real em volverem ao mesmo meio para aí continuarem o que deixaram
inacabado, muitas vezes na mesma família ou em contacto com as mesmas
pessoas, a fim de repararem o mal que tenham feito, ou de sofrerem a
pena de talião.