8.
Pode dizer-se que o mal é a ausência do bem,
como o frio é a ausência do calor. Assim como o frio não é um fluido especial,
também o mal não é atributo distinto; um é o negativo do outro. Onde não
existe o bem, forçosamente existe o mal. Não praticar o mal, já é um princípio
do bem. Deus somente quer o bem; só do homem procede o mal. Se na criação
houvesse um ser preposto ao mal, ninguém o poderia evitar; mas, tendo o homem a
causa do mal em SI MESMO, tendo simultaneamente o livre-arbítrio e por
guia as leis divinas, evitá-lo-á sempre que o queira.
Tomemos para termo de comparação
um fato vulgar. Sabe um proprietário que nos confins de suas terras há um lugar
perigoso, onde poderia perecer ou ferir-se quem por lá se aventurasse. Que faz,
a fim de prevenir os acidentes? Manda colocar perto um aviso, tornando defeso
ao transeunte ir mais longe, por motivo
do perigo. Aí está a lei, que é sábia e previdente. Se, apesar de tudo, um
imprudente desatende o aviso, vai além do ponto onde este se encontra e sai-se
mal, de quem se pode ele queixar, senão de si próprio?
Outro tanto se dá com o mal:
evitá-lo-ia o homem, se cumprisse as leis divinas. Por exemplo: Deus pôs limite
à satisfação das necessidades: desse limite a saciedade adverte o homem; se
este o ultrapassa, fá-lo voluntariamente. As doenças, as enfermidades, a morte,
que daí podem resultar, provêm da sua imprevidência, não de Deus.