Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1867

Allan Kardec

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Dissertações espíritas

As três causas principais das doenças


(Paris, 25 de outubro de 1866 - Médium: Sr. Desliens)



O que é o homem?... Um composto de três princípios essenciais: o espírito, o perispírito e o corpo. A ausência de qualquer um destes três princípios acarretaria necessariamente o aniquilamento do ser no estado humano. Se o corpo não mais existir, haverá o Espírito e não mais o homem; se o perispírito falta ou não pode funcionar, não podendo o imaterial agir diretamente sobre a matéria, encontrando-se assim impossibilitado de manifestar-se, poderá haver alguma coisa do gênero do cretino ou do idiota, mas não haverá jamais um ser inteligente. Enfim, se o espírito faltar, ter-se-á um feto vivendo vida animal e não um Espírito encarnado. Se, pois, temos a presença de três princípios, esses três princípios devem reagir um sobre o outro, e seguir-se-á a saúde ou a doença, conforme haja entre eles harmonia perfeita ou desarmonia parcial.

Se a doença ou desordem orgânica, como queiram chamar, procede do corpo, os medicamentos materiais sabiamente empregados bastarão para restabelecer a harmonia geral.

Se a perturbação vem do perispírito, se é uma modificação do princípio fluídico que o compõe, que se acha alterado, será necessária uma medicação adequada à natureza do órgão perturbado, para que as funções possam retomar seu estado normal. Se a doença procede do Espírito, não poderíamos empregar, para combatêla, outra coisa senão uma medicação espiritual. Se, enfim, ─ como é o caso mais geral, e, podemos mesmo dizer, o caso que se apresenta exclusivamente, ─ se a doença procede do corpo, do perispírito e do espírito, será preciso que a medicação combata simultaneamente todas as causas da desordem por meios diversos, para obtermos a cura.

Ora, o que fazem geralmente os médicos? Eles cuidam do corpo e o curam; mas curam a doença? Não. Por quê? Porque sendo o perispírito um princípio superior à matéria propriamente dita, poderá tornar-se a causa em relação a esta, e se for entravado, os órgãos materiais que se acham em relação com ele serão igualmente atingidos na sua vitalidade. Cuidando do corpo, destruís o efeito; mas, residindo a causa no perispírito, a doença voltará novamente, quando cessarem os cuidados, até que se perceba que é preciso levar alhures a atenção, cuidando fluidicamente o princípio fluídico mórbido. Se, enfim, a doença proceder da mente, do espírito, o perispírito e o corpo, postos sob sua dependência, serão entravados em suas funções, e não é cuidando de um nem do outro que se fará desaparecer a causa.

Não é, pois, vestindo a camisa de força num louco ou lhe dando pílulas ou duchas que conseguirão restituir-lhe o estado normal. Apenas acalmarão seus sentidos revoltados; acalmarão os seus acessos, mas não destruirão o germe senão o combatendo por seus semelhantes, fazendo homeopatia, espiritual e fluidicamente, como fazem materialmente, dando ao doente, pela prece, uma dose infinitesimal de paciência, de calma, de resignação, conforme o caso, como se lhe dá uma dose infinitesimal de brucina, de digitális ou de acônito.

Para destruir uma causa mórbida, há que combatê-la em seu terreno.

DR. MOREL LAVALLÉE.

A clareza


(Sociedade de Paris, 5 de janeiro de 1866 - Médium: Sr. Leymarie)


Conceder-me-eis hospitalidade para a vossa primeira sessão de 1866? Eu desejo, com o abraço fraterno, vos apresentar votos amigos; que possais ter muitas satisfações morais, muita vontade e caridade perseverante. Neste século de luz, o que mais falta é clareza! Os meio sábios, os papões da imprensa, fizeram valentemente o trabalho da aranha para obscurecer, por meio de um tecido supostamente liberal, tudo o que é claro, tudo o que aclara.

Caros espíritas, encontrastes em todas as camadas sociais esta força de raciocínio que é a marca inteligente dos seres realizados? Não tendes, pelo contrário, a certeza de que a grande maioria de vossos irmãos se atola numa ignorância malsã? Por toda parte as heresias e as más ações! As boas intenções, viciadas em seu princípio, caem uma a uma, semelhantes a esses belos frutos cujo âmago um verme rói e o vento joga por terra. A clareza nos argumentos, no saber, acaso teria escolhido domicílio nas academias, entre os filósofos, os jornalistas e os panfletários?... Parece-me que poderíamos duvidar, vendo-os, a exemplo de Diógenes, com a lanterna na mão, procurar uma verdade em pleno sol.

Luz, claridade, vós sois a essência de todo movimento inteligente! Em breve inundareis com os vossos raios benfazejos os mais obscuros recantos desta pobre Humanidade; sois vós que tirareis do lodaçal tantos terrícolas pasmados, embrutecidos, espíritos infelizes que devem ser lavados pela instrução, pela liberdade, sobretudo pela consciência de seu valor espiritual. A luz expulsará as lágrimas, as penas, os desesperos sombrios, a negação das coisas divinas, todas as más vontades! Cercando o materialismo, ela o forçará a não mais abrigar-se atrás dessa barreira fictícia, carcomida, de onde arremessa desajeitadamente suas setas sobre tudo quanto não é obra sua.

Mas as máscaras serão arrancadas e então saberemos se os prazeres, a fortuna e o sensualismo, são mesmo os emblemas da vida e da liberdade. A clareza é útil em tudo e a todos; no embrião, como no homem, é necessária a luz! Sem ela tudo caminha tateando, e tateando, a alma busca a alma.

Que se faça uma noite eterna! Logo as cores harmoniosas desaparecerão do vosso globo; as flores estiolar-se-ão; as grandes árvores serão destruídas; os insetos, a Natureza inteira não mais emitirão esses mil sons, a eterna canção de Deus! Os regatos banharão as regiões desoladas; o frio terá tudo mumificado; a vida terá desaparecido!...

O mesmo acontece com o Espírito. Se fizerdes noite em seu redor, ele ficará doente; o frio petrificará suas tendências divinas; como na Idade Média, o homem embotar-se-á, assemelhando sua alma às solidões selvagens e desoladas das regiões boreais!

É por isto, espíritas, que vos deveis a todas as clarezas. Mas antes de aconselhar e ensinar, começai logo por iluminar os menores refolhos de vossa alma. Quando suficientemente depurados para nada temer, podereis elevar a voz, o olhar, o gesto; fareis uma guerra implacável à sombra, à tristeza, à ausência de vida. Ensinareis as grandes leis espíritas aos irmãos que nada sabem do papel que Deus lhes confere.

1866, possas tu, para os anos seguintes, ser a estrela luminosa que conduzia os reis magos para o berço de uma humilde criança do povo. Eles vinham render homenagem à encarnação que devia representar, no mais largo sentido, o Espírito de Verdade, essa luz benfazeja que transformou a Humanidade. Por esse menino, tudo foi realizado! É ele que eterniza a graça e a simplicidade, a caridade, a benevolência, o amor e a liberdade.

O Espiritismo, também ele uma estrela luminosa, deve, como aquela que há dezoito séculos rasgou o véu sombrio dos séculos de ferro, conduzir os terrícolas à conquista das verdades prometidas. Saberá ele desvencilhar-se das tempestades que nos prometem as evoluções humanas e as resistências desesperadas da Ciência em apuros? É o que vós todos, meus amigos, e nós, vossos irmãos da erraticidade, somos chamados a melhor assinalar, inundando este ano com as claridades adquiridas.

Trabalhar com este objetivo é ser adepto do Menino de Belém, é ser filho de Deus, de que emanam toda a luz e toda a clareza.

SONNEZ.

Comunicação providencial dos Espíritos



(Grupo Delanne - Paris, 8 de janeiro de 1866 - Médium: Sra. Br...)



Os tempos são chegados em que esta palavra do profeta deve ser realizada: “Espalharei do meu Espírito sobre toda a carne; vossos filhos profetizarão e vossos velhos terão sonhos”, diz o Senhor. O Espiritismo é essa difusão do espírito divino, que vem instruir e moralizar todos esses pobres deserdados da vida espiritual que, só vendo a matéria, esqueciam que o homem não vive só de pão.

Ao corpo é necessário um organismo material a serviço da alma, um alimento apropriado à sua natureza; mas à alma, emanação do Espírito Criador, é preciso um alimento espiritual que ela não encontra senão na contemplação das belezas celestes, resultando a harmonia das faculdades inteligentes em seu completo desdobramento.

Enquanto o homem não se empenha em cultivar o seu espírito e fica absorvido pela busca ou pela posse dos bens materiais, sua alma permanece de certo modo estacionária, e lhe é preciso um grande número de encarnações antes que ela possa, obedecendo insensivelmente e como que compulsoriamente à lei inevitável do progresso, chegar a esse começo de vitalidade intelectual que lhe confere a direção do ser material a que ela está unida. É por isto que, malgrado os ensinamentos dados pelo Cristo para fazer a Humanidade adiantar-se, ela está ainda tão atrasada, pois o egoísmo não quis apagar-se diante da lei de caridade, que deve mudar a face do mundo e dele fazer uma morada de paz e felicidade. Mas a bondade de Deus é infinita; ela ultrapassa a indiferença e a ingratidão de seus filhos, e é por isto que lhes envia esses mensageiros divinos, que lhes vêm lembrar que Deus não os criou para a Terra, onde eles estão apenas por algum tempo, a fim de que, pelo trabalho, desenvolvam as qualidades depositadas em germe em sua alma e que, cidadãos dos céus, não devem comprazer-se numa estação inferior à sua ignorância, onde só as suas faltas os retêm.

Agradecei, pois, ao Senhor, e saudai com alegria o advento do Espiritismo, pois ele é a realização das profecias, o sinal brilhante da bondade do Pai de misericórdia, e para vós um novo apelo a esse desprendimento da matéria, tão desejável, porquanto só ele vos pode proporcionar uma verdadeira felicidade.

LUÍS DE FRANÇA.

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